Desmistificando, ou tentando desmistificar, o consumo da baixa renda


Foi veiculada na revista Exame uma matéria interessante, em termos de marketing e de comportamento do consumidor. Trata da dificuldade que algumas empresas enfrentam para atender aos consumidores das classes C e D, e aproveitar esta oportunidade de mercado. Mostra como falta um pensamento voltado para os consumidores (ter pensamento em marketing), e uma visão de mercado por parte de muitas empresas tupiniquins.
O pensamento, segundo a reportagem, que impera na mente das empresas é que os consumidores das classes C e D estão mais interessados no preço em sua decisão de compra do que a qualidade. Segundo pesquisa realizada com 210 empresas, e 1.0000 consumidores das classes C e D, existe falta de sinergia entre as partes. Para as empresas, os consumidores estão mais interessados em preço (44% dos executivos ouvidos), o preço é mais importante que a qualidade na decisão de compra (26%), qualidade é mais importante do que preço (18%) e qualidade é o que mais atrai os consumidores (12%). Já para os consumidores, a qualidade é mais importante que o preço (44%), qualidade é o que os atraem no momento da compra (26%), o preço é mais importante que a qualidade (17%) e estão mais interessados em preço (13%). Uma pequena inversão de valores, não é mesmo?
Bom, desconsiderando os possíveis erros que possam existir nas pesquisas, pois as pessoas podem ser influenciadas pelo pesquisador e tentar passar uma impressão que talvez não sejam as delas, podemos tirar algumas lições importantes em termos de marketing.
Percebemos uma falta de visão de mercado, leia-se, marketing. Já faz algum tempo que a imprensa especializada, ao menos aquelas que tratam de marketing, vem observando que a história de “bom é barato” não é uma verdade universal. Há poucas semanas (ou postagens), escrevi a respeito das marcas próprias, e como consumidores em países que passam por restrição de consumo, devido à crise que assola a Europa e os Estados Unidos, estão optando por produtos de marca, ou seja, com preços elevados e qualidade superior, como uma forma de pequenas indulgências, pequenos “mimos” que se dão ao direito de consumir (já propagado por Faith Popcorn há anos, mais precisamente, há uns vinte anos no mínimo). Assim, restrição financeira não significa, necessariamente, a busca por produtos de baixa qualidade. Quando existe restrição financeira, escolhemos com base na qualidade para valorizar o dinheiro, e para não perdê-lo com um produto que não apresente a funcionalidade que esperamos.
Por mais que os consumidores não tenham recursos para adquirir produtos de qualidade, ao menos em algum momento, ou quando surgir uma oportunidade (que é o que esta acontecendo com as possibilidades de maiores rendimentos das classes C e D) eles optarão por estes produtos. Todo mundo deseja, principalmente as classes mais baixas que fazem questão de primar pelo bem estar de sua família, comprar produtos de qualidade.
Já pregava, também há tempos, Prahalad com o seu livro – A Riqueza da Base da Pirâmide, que para conquistar os consumidores de baixa renda a estratégia não é preço baixo, mas sim oferecer condições para adquirir os produtos. Em seu livro até cita a Casas Bahia, onde seus preços não são os mais baixos do mercado, mas as suas “prestações a perder de vista” possibilitam acesso aos produtos de … qualidade.
Faz parte da natureza humana subir, em termos hierárquicos, o seu padrão de consumo e uso de produtos. É comum começarmos com produtos de uma escala mais baixa em termos técnicos e, assim que dominamos o seu uso, passamos para um grau superior. Começamos com um computador simples e, depois que os dominamos, passamos para um de complexidade maior. Isso se dá com telefones celulares, livros, enfim, com vários produtos de consumo. Portanto, por que com as classes C e D, em termos de produtos e de qualidade, não seria diferente? Começam com os produtos mais simples (por restrição de consumo ou até mesmo para conhecer) e na primeira oportunidade, migram para produtos melhores. É da natureza humana a busca pelo melhor.
Os consumidores não gostam de demonstrar a classe social a qual pertencem. Sempre procuramos nos apresentar como de uma classe social superior – a não ser que você já pertença a uma elite, não é mesmo? Essa busca por status é refletido no consumo. Lembram-se da mudança de bandeira do supermercado Barateiro para Compre Bem? Ela foi feita devido ao fato que os consumidores não gostavam de ser classificados como consumidores que compram em um lugar que é “barato”. Esse é o consumidor…
Enfim, poderíamos enumerar vários outros motivos para a dificuldade das empresas em entender as classes C e D. Mas, o que realmente falta é um pensamento voltado para o marketing, e procurar, a todo o momento, colocar-se no lugar de seus consumidores e não apenas copiar estratégias bem sucedidas de outros mercados. Vale a dica para os futuros profissionais da área.
Bom pensamento mercadológico para vocês…

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