A importância da Marca em ambientes de incerteza

(*) texto de minha autoria publicado originalmente no site da Iron Consultoria

Em um cenário conturbado como aquele em que nos encontramos, será que é adequado investir no fortalecimento de marca? Alocar recursos que poderiam ser usados para, por exemplo, redução de custos de produção, para alocá-los em branding? Se os consumidores procuram, e irão procurar ainda mais, preço no momento de compra devido aos seus recursos limitados, é aconselhável pensar no gerenciamento de uma marca ao invés de estratégias de redução de preço?

Bom, acredito que estes questionamentos são recorrentes, portanto, volto a questão: vale a pena investir em branding em plena crise que nos encontramos? Os consumidores compram um produto, ou a marca e todos os sentimentos que a envolvem?

Posso afirmar que sim, são investimentos que valem a pena. E, mais ainda, nunca foi tão importante pensar no gerenciamento de marca. Nunca foi tão necessário ter uma visão em longo prazo dos processos mercadológicos, e concentrar uma parte significativa de seus recursos neste importante componente de Marketing.

Não caia na tentação de acreditar que o preço é o principal determinante de compra, em muitos mercados não podemos assegurar categoricamente. Em momentos pelos quais nos encontramos, os consumidores desejam valor, e não preço. Valor significa, na percepção dos clientes, um número maior de benefícios em detrimentos aos custos envolvidos. E as marcas são estratégias usadas para aumentar os benefícios e consequentemente reduzir a percepção de custos. Uma marca permite que os consumidores reduzam o seu ciclo de compra (menor necessidade de pesquisas e um produto já validado no mercado) o que significa menores custos, portanto, maior a percepção dos ganhos envolvidos em um relacionamento comercial.

Além da percepção de valor, lembre-se que uma marca deve ser a representação máxima de uma empresa, independentemente do produto comercializado e do tamanho da empresa, assim, cabe neste momento um questionamento, ou melhor, uma reflexão: você vende um produto ou um propósito?

Se você oferece um produto, ainda mais em mercados turbulentos ou com as poucas diferenças em relação aos concorrentes de mercado (as novas tecnologias de produção estão reduzindo as diferenças entre as ofertas), pode ser que tenha certa dificuldade na condução de seu negócio, afinal, produto qualquer empresa pode disponibilizar aos consumidores implicando na tendência de cair nas famosas guerras de preço. E mais interessante ainda neste processo de percepção dos clientes, sem considerar as marcas, muitos consumidores tendem a ter dificuldade em diferenciar uma oferta. Você conseguiria listar as diferenças entre duas marcas de smartphones? Muitos não conseguem, e assim usam de atalhos para facilitar as suas decisões, qual atalho? Marca, uma marca forte.

Ainda em relação aos investimentos na gestão de marca, é importante ressaltar que os consumidores não compram um produto, e sim, a solução de um problema. Agora se a sua empresa vende um propósito, e desde que ele seja verdadeiro, ela pode levar uma vantagem em relação aos rivais na percepção dos clientes. Será que um novo entrante no mercado de produtos de beleza pode argumentar que tem um apelo socioambiental como a Natura? Pode ser até que tentem, mas este propósito já é dela, e caso alguém queira copiar, bom, você pode imaginar. Lembraremos da Natura imediatamente, ou simplesmente faremos comparações: “ah, bem que este produto poderia ser igual a Natura…”. Este é o adequado fortalecimento da marca e do propósito de uma empresa.

Desta forma, um adequado gerenciamento de marca deve de forma clara demonstrar o seu propósito, sua razão de existência, tudo que vale a pena lutar, acreditar, e naturalmente abrir mão em suas decisões cotidianas para manter seus ideais. A marca de roupas esportivas Patagonia chegou ao ponto de incentivar os seus consumidores a comprar com menor frequência seus produtos para que houvesse um menor prejuízo ao meio ambiente. Este apelo foi expressado em um famoso anúncio publicado em jornais de grande circulação em mercado norte-americano. Em termos simples, reduziram as suas vendas para manter o seu propósito. Abriram mão de ganhos em curto prazo para fortalecer relacionamento em longo prazo.

Uma marca que expressa de forma clara o seu propósito pode levar vantagem em mercados instáveis. Em condições de igualdade os consumidores tendem a preferir aquelas marcas que os representem, ou ao menos que eles percebam que demonstre a mesma forma de pensar ou agir, ou simplesmente a maneira que eles gostariam de pensar e agir. A marca é a representação, por meio de signos facilmente identificáveis, do que um grupo de consumidores pensa, se comporta e se relacionam com o mercado e com a sociedade. Estas representações são um forte determinante de compra, e influenciam nos processos decisórios.

Em muitas situações de mercado, por uma marca ser algo que estamos expondo visualmente em nosso cotidiano, como o logo da Nike evidenciado em seus produtos, como o seu aparelho celular com a sua marca destacada na parte traseira, o carro que dirigimos ou o restaurante que frequentamos, elas tornam mais evidentes nossos ideais, nosso propósito, nossa forma de se relacionar com o mercado e com os nossos pares. E o mais interessante neste processo, todos estes sentimentos envolvidos no relacionamento com uma marca não podem, em muitos casos, ser verbalizados pelos consumidores, eles simplesmente sentem. Eles simplesmente usam uma marca para representar determinadas posições.

No exemplo que citamos da Patagonia, seus usuários demonstram sua forma de pensar em relação ao meio ambiente, e o mais interessante, a marca auxilia estes consumidores a demonstrar aos seus pares sua posição, seu posicionamento social. Da mesma forma que os usuários da Apple evidenciam, por meios dos produtos que usam, sua jovialidade, sua percepção de status, sua superioridade tecnológica, bem como o “desafio ao status quo” sempre presente em suas estratégias promocionais. Em termos simples, são gatilhos que representam o seu propósito na percepção de seus consumidores, gatilhos acionados por meio de um estímulo (um forte estímulo) de marca.

Esta representação, além de demonstrar a forma de pensar de determinados grupos de consumidores, ainda fortalece a posição do indivíduo em um grupo, ou simplesmente, de fazer parte de um grupo. Quando usamos a mesma marca que outras pessoas nos sentimos mais confortáveis, temos indiretamente a validação dos pares. É a mesma situação que ocorre quando cumprimentamos alguém que usa um agasalho da faculdade em que nos formamos. Gostamos de presenciar pessoas com o mesmo gosto, e ainda mais, com o mesmo propósito. Note a importância da marca, um simples estímulo que nos ajuda a manter filiações com grupos que gostamos de pertencer, que nos traz sentimento de pertencimento, tudo isso pelo estímulo de uma marca.

É interessante ressaltar que os consumidores compram as histórias que uma empresa conta, desde a narrativa de como cura a sua dor de cabeça mais rápido que os rivais (Doril), o melhor conforto ao dirigir (uma Ferrari, de preferência amarela), ou aquele produto que deixa as roupas mais brancas ao lavar (OMO). Note que importante este ponto ressaltado nestes simples exemplos, não são atributos técnicos, mas soluções. Agora, se estas narrativas estiverem relacionadas a um bem maior, como o número de marcas que estão procurando ajudar os mais necessitados como neste período de pandemia, maior é a percepção da força de uma marca. Melhor será o entendimento da história que pretendem contar aos seus consumidores. Sem mencionar as vantagens de uma história bem contada em termos de percepção dos clientes, mas este é assunto para uma nova postagem.

Ao pensar no gerenciamento de marca lembre-se que os consumidores querem ser representados por empresas que tenham significado, que tenham propósito. E como demonstrar o seu propósito? Por suas ações do dia a dia. E como tonar tangível estas ações? Conhecendo os seus consumidores, e expressando-as por sua marca, pela adequada gestão de marca. Somente desta forma o preço se tornará irrelevante no momento da compra. Somente desta forma você conseguirá manter a competitividade em mercados em constante transformação.

Portanto, vale o investimento em marca? Bom, estes foram apenas alguns argumentos, mas podemos afirmar que sim. Portanto, pense em Marketing, e construa uma marca relevante para a sociedade, e contribua para tornar seus consumidores pessoas melhores.

 

 

 

 

 

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